Questões preliminares para uma escuta inteligente da música
- Humberto Piccoli
- 28 de mar. de 2018
- 3 min de leitura

No livro “Como Ouvir e Entender Música”, o autor e compositor americano Aaron Copland sugere algumas atitutes e desmistificações preliminares para uma escuta mais proveitosa de uma música.
Em primeiro lugar, Copland sugere duas perguntas que todo compositor gostaria de saber a respeito de seus ouvintes:
Você está ouvindo tudo o que está acontecendo?
Você está sendo realmente sensível a isso?
Essas perguntas podem ser colocadas também de outra forma:
Você está perdendo alguma coisa no que se refere propriamente às notas musicais?
A sua reação é confusa, ou você tem realmente idéia de qual seja a sua resposta emocional?
Se você é como eu, uma resposta sincera será um belo e sonoro “não” a todas as quatro perguntas. Ao mesmo tempo, saber quais são os desejos de um compositor em relação ao seu ouvinte pode ajudar – e muito – a entender a música de forma semelhante ao seu criador e, portanto, de acordo com o primeiro propósito da própria música.
Não quero dizer com isso que exista apenas uma maneira de escutar, interpretar e apreciar música. Quero dizer que existem intenções e idéias concretas e abstratas vindas do compositor que podem – muitas vezes - ser identificadas através de uma escuta que leva em consideração os seus desejos em relação ao ouvinte. Então, como chegar mais próximo de um “sim” verdadeiro a essas perguntas?
Copland sugere algumas idéias preliminares que podem facilitar o início da sua próxima escuta. Aqui estão elas:
Não adianta ler mil livros sobre apreciação, a melhor coisa a se fazer para se entender música melhor, é ouvir música.
O acesso à música é quase completamente gratuito e de muito fácil acesso.
Desmistificar a crença de que é preciso entender muito de música para poder escuta-la. No teatro e literatura não há esse tipo de resistência. Você não precisa saber tudo de teatro para poder assistir a uma peça, por que deveria saber tudo de música para ir a um concerto ou escutar uma música com cuidado e atenção em casa?
Ser musical não significa saber tocar uma peça imediatamente ao ouvi-la uma vez, ou possuir ouvido absoluto. Ter conhecimento sobre música requer escuta ativa e atenção.
O requisito básico para uma escuta inteligente é reconhecer uma melodia e ser capaz de identificar suas variações e mudanças no decorrer de uma peça musical.
Para se ter uma escuta inteligente, é necessário saber relacionar os eventos anteriores e posteriores a uma melodia identificada. A melodia é o fio condutor de uma história musical.
A prática e a compreensão não andam necessariamente juntas. Pode-se tocar peças extremamente complexas e não se entender absolutamente nada de música. Este é um mito muito comum entre estudantes de música, que acham que a prática intensa e o perfeccionismo da performance elevam o músico a uma espécie de “conhecedor profundo” da música. Na prática ele desvenda os mistérios técnicos da música, mas será consegue responder às 4 perguntas sobre o seu entendimento somente tocando um repertório com muita habilidade? Ao mesmo tempo, a prática também pode auxiliar muito no processo.
Com essas idéias preliminares, já podemos começar a escuta de um repertório musical. A escuta ativa não depende de conhecimentos teóricos, depende apenas de atenção e concentração. Lembre-se das perguntas de Copland. Você consegue ouvir tudo o que acontece? Você consegue identificar as respostas emocionais que esses acontecimentos provocam em você?
A partir de agora, a não ser que você não preste atenção suficiente, sua resposta será sempre um grande e sonoro “sim”.
*crédito da foto: by Thomas Leuthard
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